segunda-feira, 11 de outubro de 2010

I SEMINÁRIO RASURAS: CORPO, LEITURA E ESCRITA



semrasuras@gmail.com




O I Seminário Rasuras: corpo, leitura e escrita promove o debate acerca de processos de leitura e escrita que se desenvolvem incontroláveis pela cidade, escrevendo a malha urbana, bem como os corpos que nela transitam. Desta forma, somos provocados a pensar como a leitura indisciplinar de textos multimodais, aqueles em que há a co-ocorrência de imagens, grafismos, sons, gestualidades, têm se disseminado na vida dos jovens nas periferias urbanas e como a escrita a contrapelo de normas gramaticais e sociais tem grafado, grifado e grafitado, da parede às telas de computador, não apenas riscos, mas outras formas potentes de subjetividades.


PROGRAMAÇÃO:




13 de outubro


14:00 – Mostra de documentários recartoGRAFIAS:
Herança Guerreira de Almir Meireles, Diego Beda e Helder Rezende.
Malvinas: do outro lado da ocupação de Gabriel Teixeira.
16:00 – Palestra: Letramentos de resistência: culturas e identidades no movimento hip hop – Profa Ana Lúcia (ILUFBA)

17:00 às 18:30 – Performances: RAP, graffiti e outras manifestações de leitura/escrita urbanas
19:00 – Abertura oficial do evento
19:30 - Mesa-redonda: Interfaces de leitura e escrita: dos muros à tela, do corpo às pick-ups
Profª. Milena Britto (IL/UFBA) - media dora, DJ Branco, Adson BOOB (grafiteiro), Negramone (b-girl)
14 de outubro


14:00 – Mostra de documentários recartoGRAFIAS:
Hip hop com dendê de Fabíola Aquino
O Resgate pela Arte de Antonio Anjos, Dinaldo Santos, Hilka Costa, Luciano Souza, Igor Leonardo
16:00 – Apresentação dos projetos de pesquisa que integram o Grupo Rasuras: estudos de práticas de leitura e escrita
17:00 às 18:30 – Performances: RAP, graffiti e outras manifestações de leitura/escrita urbanas
19:00 – Mesa-redonda - Etnoletramentos: quando o corpo negro é o texto
Prof. Henrique Freitas (IL/UFBA) - mediador, Prof. Nelson Maca (UCSAL/BLACKITUDE), Prof. Eduardo Oliveira (FACED/UFBA)



O EVENTO OFERECE CERTIFICAÇÃO COM CARGA HORÁRIA TOTAL DE 16 HORAS PARA OS INSCRITOS COM PARTICIPAÇÃO MÍNIMA DE 75%.


ISCRIÇÕES PELO E-MAIL: semrasuras@gmail.com
ENVIAR NOME COMPLETO E ENDEREÇO DE E-MAIL






Promoção:
Grupo de pesquisa Rasuras: estudos de práticas de leitura e escrita (ILUFBA)
Organização:
Prof. Dr. Henrique Freitas, Profª. Drª. Milena Britto, Profª. Drª. Nancy Vieira
Apoio:
Pró-reitoria de extensão da UFBA, ILUFBA, IHAC,PETROBRÁS

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Alinhamentos da cidade


Publicado no Jornal A tarde, caderno 2+ em 02/10/2010


O resultado de “Noites urbanas”, primeira ficção adulta do jornalista Daniel Piza, não é surpreendente, mas aponta para algumas marcas que, quiçá, pairem sobre a produção contemporânea: cidade e sujeito compartilham um tempo de voracidade e de tensões que fragmentam ambos; linguagem que resiste a contrastes e se mantém na representação direta da cotidianidade; apropriação dos condensados e novos meios de expressão, seja na imitação da linguagem gerada por esses meios, seja na inclusão dos mesmos na dinâmica comunicativa das personagens: Twitter, Blogs, Orkut, MSN, etc.
Os minicontos e contos do livro oscilam. Alguns, como “A escada rolante”, cujas poucas linhas não conseguem sequer explorar o movimento e as imagens que o título sugere, “Auto estima” e “Memória do futuro”, povoados de clichês sobre o universo feminino, não mereciam estar no livro, carecem de “história” e ritmo.
Mas há ali contos que alcançam magistralidade narrativa. O mini-conto “A ficha” tem quatro linhas, mas se realiza de forma contundente, dispara as situações do dia-a-dia em um tema tão afetado: a traição, a separação. As poucas palavras do conto são suficientes para invadir a casa de casais citadinos de classe média e o leitor mergulha nas tensões insinuadas e absorve as intimidades das quatro personagens que aparecem em tão pouco espaço narrativo.
O conto “Jogo da verdade” é outro que atinge qualidade e atrai o leitor para a sua estrutura interna. Lembrando, talvez, um filme do movimento Dogma - ou outro desses que colocam casais juntos para explorar a dinâmica e o que sairá depois das hipócritas relações e aparências se desfazerem sob o peso da intimidade cotidiana- a narrativa movimenta as personagens em torno de situações corriqueiras e põe assim em cheque também as escolhas, apontando para uma visão pessimista: os sujeitos da cidade estão embrenhados em tanta vida que nem sabem viver. A traição e falsidade cegam fortemente e o desfecho do conto prende o leitor numa teia violenta.
“Ledinha” e “Circuito interno” têm boas propostas, ainda que ambos não logrem extrapolar uma história bem contada. Ainda assim, se observam as nuances de uma boa literatura urbana: as tensões são conhecidas, as personagens vivas: boa construção, aliás, das personalidades das personagens, nos dois contos, mulheres que lutam para ter-se livre das amarras da sociedade e reivindicarem seus espaços de protagonismo, dentro das armadilhas todas que a vida impõe ao gênero.
O livro de Piza escolhe o humor, um certo humor irônico, para tratar dos temas, mas algumas vezes esse artifício é o mesmo que compromete as histórias. Em todo caso, é uma coleção interessante de narrativas longas e curtas que trazem à tona a solidão, o “contágio” do desassossego urbano, as tensões, as nuances e a virtualidade de uma cidade como São Paulo, onde se pode ver que as personagens são tão vinculadas aos espaços que ali estão e seus cotidianos vorazmente devorados pelo caos que, sob a noite, adormece.

Noites Urbanas/Bertrand Brasil/176p

A graça das horas



Publicado no A tarde - caderno 2, em 11/09/2010


A língua portuguesa tem plantado hastes na poesia com Camões, Pessoa, Drummond, João Cabral, Cecília Meirelles, Bandeira, o polifônico Valencio Xavier e tantos outros que adormecem sob a nossa falta de cuidado. É talvez sob o peso desse quase silêncio em torno do poeta carioca Bruno Tolentino que a reedição de sua obra “As horas de Katherina” chega.
Além dos 166 poemas de “ As horas”, o livro traz ainda a peça inédita “A andorinha, ou: A cilada de Deus”, cuja dramaticidade e eloqüência surpreendem os bons conhecedores do gênero, e um belo prefácio de Alcir Pécora.
Os 166 poemas das Horas de Katharina, que versam sobre a conversão de uma carmelita, são um verdadeiro manancial de erudição do autor, que demonstra referências históricas e profundo conhecimento clássico, lingüístico, além de uma variada experiência poética com relação à forma, à rima, à metrica: versos decassílabos, hexassílabos, octassílabos, sonetos, sextilhas e assim seguindo por longo caminho de domínio da arte poética, sem, entretanto, deixar de exibir que a forma obedece ao pulso da poesia: nada deve – ou neste caso é - ser gratuito.
À primeira vista, a poesia de Tolentino pode assustar os que não percorrem as muitas referências abordadas formalmente e tematicamente. Nessa obra, o tema espiritual é explorado também intertextualmente, já que as referências ao “Livro de Horas”, destinado às orações privadas na tradição catolica, é não apenas na estrutura, mas na articulação e organização temática. Há ali a estrutura das missas, dos rituais de devoção, a cultura católica de rezas, orações e uma infinidade de ritos de passagem.
Os poemas são uma experiência intensa, espaço no qual se vivencia a exploração dos recônditos da alma numa atitude de devoção e perseguição do caminho espiritual da heroína. A solidão da experiência mística é tão visceral quanto é gracioso, e o espanto também faz parte da descoberta. Assim, poemas como “Miserere” “Vade retro”, “O espelho”, “As luas” dimensionarão na linguagem, no mote, na forma, uma vastidão de tempo e sentimento que se espera apenas de quem vivencia a experiência, tanto a mística quanto a humana diante de situações marcadas por ícones.
O interessante das 8 partes de “As horas” é que não se esgotam as possibilidades de leituras, tanto da “perigrinação” espiritual de Katherina quanto dos movimentos católicos míticos e místicos. Os poemas de “As horas” cuidam do ambiente interno do convento, e, metaforicamente, do espaço espiritual e da natureza humana; esse ambiente é vivenciado também nos processos formais de estudos, observações, encontros e tensões – ali há as rezas, orações, livros, passagens bíblicas e teológicas: referências que são assinaladas em notas para os que, como eu, não possuem todos os instrumentos de leitura, além de símbolos e expressões do universo popular - e a relação pessoal de Katherina com a experiência religiosa. Mas, o mais valoroso dessa nova reedição é que a peça inédita “A andorinha”, de certa forma, compõe e completa a épica passagem da heroína pois é sobre o universo exterior ao convento e as relações familiares da “persona”.
Os diálogos são um desenho maravilhoso da dramaticidade oral e, ao mesmo tempo, um vivo encontro de personalidades intensas e profícuas. Tem-se, no conjunto, o retrato completo de uma heroína (alter ego de Bruno, segundo Pécora).
Todo o livro é de uma experiência única e valiosa: ler Tolentino é um desafio e, ao mesmo tempo, é ler poesia de uma maneira que só a palavra mesma pode dimensionar: Poesia.
As horas de katherina/Bruno Tolentino/Record/399 p.