quinta-feira, 2 de junho de 2011

A diversidade sexual no Brasil contemporâneo

Publicado no A tarde 21/05/2011


O livro “Retratos do Brasil Homossexual: fronteiras, subjetividades e desejos” apresenta um retrato do Brasil com relação à homossexualidade. Os 98 artigos que compõem o livro noticiam da lei às artes e trazem o gay, a lésbica, o trans e o travesti como sujeitos de uma outra história do Brasil.
A comparação que o organizador Horácio Costa faz com outro livro famoso, “Retratos do Brasil”, de Paulo Prado, é pertinente. Aquele livro trouxe a cena da história brasileira moderna à discussão e ainda hoje, oito década depois, o clássico serve para interpretar e entender o Brasil; esse outro “Retratos” desloca o assunto para um lugar de observação contemporâneo. E é daqui que se prepara o ângulo para que esse “retrato” desnude aquilo velado ou invisibilizado por tantos mecanismos.
Depois de passar esses últimos tempos discutindo a união civil entre os homossexuais, talvez o brasileiro ache-se avançadinho. Mas é melhor se debruçar sobre “as imagens” dessa cena para entender o quanto se tem ainda por fazer. Ao mesmo tempo, percebe-se que o Brasil caminhou bastante em direção a esse lugar que se quer desde a sua construção de nação: um país diverso.
Os textos detêm-se sobre os temas que já conhecemos – homofobia, desejo reprimido, discriminação, comportamentos gays - e outros ainda pouco discutidos – as cirurgias para mudança de sexo, a situação dos trans e dos intersexos, as leis que regulam práticas sobre o corpo.
Os trans, ainda pouco inseridos nas discussões, são tratados em alguns dos artigos, como o de Berenice Bento, autora do livro “A reinvenção do corpo”. No artigo presente no livro, ela aborda a identidade legal de gênero, destacando a problemática entre os travestis e os transexuais. Os conflitos entre situação “cromossomática” do corpo, genitália, identidade de gênero, performance e ajuste ao nome legal são imensos e as conseqüências são das mais subjetivas às trágicas física e socialmente.
Artigos sobre cultura e representações revelam que a homofobia costuma ser “plantada” até mesmo quando se pensa que há uma abertura e uma boa intenção por parte dos que apresentam gays em seus produtos. Leandro Colling discute isso em “A representação da homossexualidade na telenovela Duas caras”, onde analisa as personagens gays desmontando os estereótipos e demonstrando criticamente as artimanhas da heteronormatização. Do que adiante ter um gay na novela se esse gay não tem desejo, não beija, não casa? Acaso existe amor sem corpo?
No artigo “Corpo e fotografia em Erwin Olaf” Wilton Garcia analisa aspectos subjetivos da homocultura a partir da série fotográfica “Fashiom victms”, destacando a relação do corpo exposto e explorado como mercadoria e os desejos projetados por construções simbólicas prévias.
A literatura e o teatro são abordados em vários artigos que analisam as personagens e as construções estéticas que compõem as representações. Há desde textos sobre uma intencionalidade queer na obra até aqueles considerados principalmente por sua autoria, como dos de Trevisan ou Caio Fernando Abreu. Mas a maioria dessa literatura, como mostram vários textos ali, traz o homossexual como um suspeito: as personagens ambíguas, sem clareza de sexo, com algo oculto.
“Retratos do Brasil Homossexual” faz-nos pensar nos desafios identitários contemporâneos. No livro, o direito e a medicina fazem coro com a literatura, o teatro, o cinema para deixar exposto o tanto que esse Brasil moderninho precisa ainda caminhar. É necessário, verdadeiramente, abrir as cabeças, e as pesquisas ali, sérias e pertinentes, devem ajudar na compreensão intelectual e política desse tema caro. Que essa diversidade saia daquelas páginas e se espalhe por nossas vidas. Com fotos e flashes para dar novos “retratos”.

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