sábado, 1 de maio de 2010
Mulheres na psicanálise e no divã; Freud no banco dos réus
É difícil que alguma mulher não tenha, em algum momento, chocado-se diante das colocações de Freud, afinal, “inveja do pênis” é tão grotesca colocação que defensor algum de Freud conseguiu amenizar a sua “culpa”, e, ainda que as interpretações contemporâneas considerem o contexto em que foram interpretadas as perigosas – e perversas- afirmações, a memória do pensamento ocidental está contaminada por esses “mitos” e as mulheres serão sempre as mais atingidas. Até a liberdade sexual da mulher conseguiram atribuir a Freud.
Mas é fato que o século XX foi marcado pela psicanálise. Na linguagem, o “inconsciente”, o “ato falho”, “complexo de Édipo”, e outras tantas formas de se falar dos mistérios do comportamento do sujeito estão aí. E Freud também conseguiu, ainda que questionemos, “pousar” (porque penetrar, no consciente uso da palavra que aqui faço, não caberia) na intimidade das mulheres.
É partindo justamente da atuação de Freud no seio dessa “intimidade” que Lisa Appignanesi e John Forrester, em “As mulheres de Freud”, se detêm sobre o papel das mulheres no nascimento da psicanálise. A dupla explora as leituras de, e sobre, Freud, documentos, cartas, fotografias, etc., para construir uma rede em que se possa analisar as acusações de misoginia e de patriarca conservador que via como principal função das mulheres “servir à reprodução da espécie” atribuídas ao pai da psicanálise. Vão, segundo os próprios, dissecar “o caso de amor” que Freud teve com as mulheres para que o feminismo contemporâneo possa, de forma mais completa e complexa, fazer as suas reflexões.
As duas primeiras partes do livro é escrita por Forrester, historiador que se detém sobre as imagens femininas utilizadas nas interpretações dadas por Freud e nos impasses gerados por estas. O autor analisa momentos-chaves da teoria freudiana a partir do lugar que o feminino ocupa na obra e na vida de Freud. Os capítulos abordam o tema da maternidade, o complexo de Édipo, analisa a relação de Freud com a família, com a mãe, o ciúme doentio e possessivo da esposa, e, mais tarde, a relação diferenciada com a filha Anna Freud, a “Antígona”, caçula de três irmãs.
John reconstrói a trajetória de Freud desde criança e preenche os espaços que faltam com observações e inferências que não soam gratuitas. Os capítulos são bem pensados, acessíveis e coerentes. Ao final de cada capítulo de todo o livro há a lista das notas bibliográficas citadas e é interessante ver como a construção dessa “história ficcional” é guiada, principalmente, pelos momentos de tensão ao redor de Freud, sejam esses em sua própria vida ou na repercussão de seu trabalho.
No segundo momento do livro, Lisa Appignaneri vai tratar das mulheres mais importantes na história de Freud, mas o mais interessante é que a autora recupera o lugar dessas mulheres, diferentemente do trato sobre o “feminino” dado por John Forrester, oferecendo a elas uma autonomia e a possibilidade de figurarem como sujeitos de suas próprias histórias – como “analistas” ou como “pacientes”.
Appignaneri investiga diversas fontes, tal como John, mas se mostra interessada no que essas mulheres geraram como “autoras” na relação que tiveram com Freud e, consequentemente, com a psicanálise. Assim, Anna Freud, a filha, a escritora Lou Andreas-Salomé, que se relacionou com Nietzsche e Rilke, a socialista feminista Helene Deutetsche, a princesa Marie Bonaparte – presente no cenário que levou à expulsão de Lacan do movimento psicanalítico francês- , vão ser “escritas” a partir da combinação de suas biografias com o que se sabe de seus pensamentos e atuações, sem que seja deixado de lado o principal: as relações das mesmas com Freud no e fora do divã.
O resultado do livro, o qual eu vejo como mais um produto da “cultura freudiana”, é um espaço mais interessante para se questionar o papel da mulher na psicanálise, plantando-se a dúvida em torno do futuro das práticas psicanalíticas e na própria relação da mulher com o que sobrou daquilo pensado por Freud para elas. Há uma crítica a adesão ingênua às colocações freudianas e um olhar mais sóbrio sobre a repercussão do encontro de Freud com as várias mulheres que passaram por sua vida.
As mulheres de Freud/ Lisa Appignanesi e John Forrester/ Trad. Nana de Castro e Sofia Silva/Record/728 p/ 89,90.
Publicado no A tarde, caderno 2+, 01/05/2010
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A-do-re-i, belíssima! E vamos hoje ao cinema, quero dizer montes de coisas e saber outros montes e abraçar para matar a saudade!
ResponderExcluirQue linda estava hoje na Page T!!!
Jô
Jô: Não seria nada mal o cinema, mas, já tenho duas possíveis atividades agendadas e convido você para qualquer uma delas: ou com umas amigas ao cine vivo ver o filme de guillermo arriaga, ou com outras ao ciranda onde a dj adriana prates faz o som. Beijos.
ResponderExcluirPois para mim as mulheres devem sua liberdade sexual a Freud mesmo.O que não impede de eu ter gostado do seu texto ;->, mas, menos, fofa, Freud não foi tão mal assim. A 'pequena morte' foi divida com a mulherada!
ResponderExcluiressa história de "inveja do pênis"... por favor!!!
ResponderExcluiradorei o texto.
Mila, muito massa a resenha.Esse negócio de ficarem ainda em Freud já era!
ResponderExcluirVocê sumiu, estava viajando?
Beijos
Juliana