Milena Britto – professora do Instituto de Letras da Ufba
millenabritto@hotmail.com
Nilson Galvão e Mônica Menezes possuem em comum algumas coisas: são poetas, blogueiros e publicaram pela coleção Cartas baianas. Os estilos, entretanto, são distintos, possuindo em comum a certeza de usarem a poesia para dar conta de um mundo grande que os acolhe e do mundo outro que habitam de verdade.
De ambos, coincidentemente, eu conhecia uma que outra poesia por fuçar blogs vez em quando, sempre pensando em arranjar tempo para escever sobre escritores que começaram com o blog.
Ambos utilizam os respectivos blogs mais como suporte e lugar de interação com o público do que como “linguagem”, ainda que os dois, cada um em seu estilo, algumas vezes insiram “imagens” para ilustrar os seus posts na blogosfera. Na transposição para livro, o trabalho não remete, em sua estrutura - versos, linguagem ou ritmo - ao suporte virtual.
“Caixa Preta”, de Galvão, que recebeu menção honrosa do projeto arte e cultura do banco Capital, é um conjunto de poemas que se move, coerentemente, pelas inquietas relações homem-mundo-vida-existência-morte-amor. Pode-se ver algo, de algum modo, nietzschiano por ali, além de algumas diretas referências, como à poesia de Walt Whitman ou à música de Billie Holiday.
Os versos possuem um sujeito lírico que assume a voz de todos nós, refletindo esse lugar do homem que pensa, sente e se inquieta: “Sou o veículo dessa história/qualquer em meu coração/sem prumo.O destino se esqueceu/de mim”.
Os poemas possuem distintas formas, a maioria sendo espécies de narrativas, pontuados, versos sem rimas, com quebras de ritmo interessantes, como se o corpo fosse tão convidado a “sentir” os poemas quanto, em maior intensidade, o pensamento: “O mundo gira, o menino chora:/dói o menino, onde mesmo será/que ele sente essa falta, e se sente/essa falta quem sabe girar pra saber/que ela dói,que ela/ dói mas é breve,/tão breve quanto o mundo que chora.”
O lirismo dos poemas nos chega colado às palavras escolhidas. Poesia para pensar e sentir, profundamente, as coisas, e dar às coisas seu sentido perdido. É boa poesia - para pensar ou para sentir.
Em “estranhamentos”, que também recebeu menção honrosa do banco Capital, Mônica Menezes nos coloca diante de um eu-lírico romântico, sensível, que utiliza a memória como “lugar” de encontro, expondo o seu sentir e compartilhando suas surpresas, suas dores, tristezas, amores, e oferecendo sempre um certo espanto, ou “estranhamento”: “amado, jamais serei a tua Dora Diamant/simplesmente porque sou outra mulher/e tu és outro homem/não sei cantar na língua sagrada/e nunca sonhamos com Tel Aviv/ no entanto desejo,/como a moça judia,/acolher-te o derradeiro gesto/ e talvez o meu grito/também dissipe o eco/da última oração”.
Com tons de Clarice, Adélia Prado e até Leminski, Mônica vai brincando, ora concisa, ora farta, com a relação entre sentimento e poesia, deixando-nos um rastro forte de memória - quase nossa de tanto que é íntima: “Meu avô/é uma cadeira de balanço/vazia”.
E oferece ainda uma marca feminina aguda, explorando todos os espaços de ser um sujeito poético feminino; e farto vocabulário ligado à natureza, sem medo ou pudores: “amanheceu/e o meu amor transbordou/chovi chovi chovi/uma forte chuva de amor”.
Os poetas-blogueiros se revelam, em seus livros, sérios em suas buscas, experimentando menos e trabalhando mais no sentido, preocupados em deixar a sua poesia dividir sentimentos, dúvidas, certezas, angústias e espanto. Eu espero vê-los em muito mais páginas, esquinas e “posts” na Bahia (dot com).
Estranhamentos /Mônica Menezes/ P55
/48p e Caixa Preta/ Nilson Galvão/P55/48 p.
sábado, 23 de abril de 2011
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